

ONU declara fome em Gaza, Netanyahu denuncia 'mentira descarada'
A ONU declarou, nesta sexta-feira (22), um cenário de fome extrema em Gaza, depois que os especialistas da organização alertaram que 500.000 pessoas enfrentam uma situação "catastrófica" e no momento em que Israel ameaça destruir a maior cidade do território palestino.
O primeiro-ministro de Israel, Benjamin Netanyahu, reagiu classificando o anúncio como "uma mentira descarada". "Israel não tem uma política de fome. Israel tem uma política de prevenção da fome", afirmou o dirigente, segundo seu gabinete.
Após meses de advertências sobre a fome no território devastado pela guerra, a Classificação Integrada de Segurança Alimentar (IPC), órgão da ONU com sede em Roma, confirmou que a população da Cidade de Gaza está passando atualmente por uma situação de fome extrema, que também deve afetar as áreas de Deir al Balah e Khan Yunis até o final de setembro.
A região administrativa de Gaza representa quase 20% do território palestino. Somando-se Khan Yunis (29,5%) e Deir al Balah (16%), chega-se a 65,5%, o equivalente a dois terços da Faixa de Gaza, com 365 quilômetros quadrados, onde vivem amontoados mais de dois milhões de palestinos.
Segundo os especialistas da ONU, mais de meio milhão de pessoas em Gaza enfrentam condições "catastróficas", o nível mais elevado de penúria alimentar no IPC, caracterizado por fome extrema e morte.
A inanição "poderia ter sido evitada" sem "a obstrução sistemática de Israel", acusou o diretor do Escritório para Coordenação de Assuntos Humanitários (OCHA, na sigla em inglês) da ONU, Tom Fletcher, em uma entrevista coletiva em Genebra.
O Hamas pediu "uma ação imediata da ONU" para encerrar a guerra e "a abertura sem restrições das passagens fronteiriças" com vistas à "entrada urgente e contínua de alimentos, medicamentos, água e combustível".
- "Crime de guerra" -
Diariamente, jornalistas da AFP na Faixa de Gaza assistem à distribuição de alimentos, onde multidões de palestinos se aglomeram gritando, chorando e implorando para encherem suas panelas vazias com comida.
O Alto Comissário das Nações Unidas para os Direitos Humanos, Volker Türk, afirmou que "é um crime de guerra utilizar a fome com fins militares".
"Não podemos permitir que esta situação continue com total impunidade", declarou o secretário-geral da ONU, António Guterres.
A Cruz Vermelha, por sua vez, instou Israel a "satisfazer as necessidades básicas" dos moradores de Gaza, enquanto o Reino Unido classificou a situação como um "escândalo moral".
Algumas horas antes da divulgação do relatório, o ministro da Defesa israelense, Israel Katz, prometeu destruir a Cidade de Gaza, a maior do território, se o Hamas não concordar com o desarmamento, com a libertação de todos os reféns que permanecem no território e em encerrar a guerra nos termos de Israel.
"Se eles não concordarem, Gaza, a capital do Hamas, se tornará Rafah e Beit Hanoun", acrescentou, em referência a duas cidades na Faixa que foram praticamente destruídas desde o início da guerra.
A afirmação aconteceu um dia depois de Netanyahu autorizar "negociações imediatas" para "libertar todos os reféns" que continuam em Gaza.
Sem mencioná-la explicitamente, o primeiro-ministro israelense respondeu assim à última proposta dos mediadores (Egito, Catar e Estados Unidos) para um cessar-fogo.
- "Estamos morrendo" -
Israel, que diz querer negociar um cessar-fogo e a libertação de reféns, controla quase 75% do território palestino e intensifica a pressão militar.
A Defesa Civil do território palestino indicou que 46 pessoas foram mortas nesta sexta-feira em ataques e disparos israelenses, mais da metade na Cidade de Gaza.
"Os bombardeios não cessaram desde a manhã (...) Mas não sabemos para onde ir. Estamos morrendo", declarou Umm Mohammed Nasr, de 42 anos, mãe de quatro filhos.
Dadas as restrições impostas por Israel à imprensa em Gaza e às dificuldades de acesso ao local, a AFP não pode verificar de forma independente estes números ou as afirmações do Exército israelense.
O Hamas aceitou, na segunda-feira, um projeto de acordo que, segundo fontes palestinas, prevê uma trégua de 60 dias, período em que os reféns em cativeiro em Gaza (49 no total, incluindo 27 considerados mortos pelo Exército israelense) seriam libertados em duas etapas em troca da libertação de centenas de prisioneiros palestinos.
Israel, no entanto, insiste em que qualquer acordo deve incluir a libertação simultânea de todos os reféns.
O ataque do Hamas a Israel em outubro de 2023, que desencadeou o conflito, causou a morte de 1.219 pessoas, a maioria civis, segundo uma contagem da AFP baseada em números oficiais israelenses.
As represálias de Israel em Gaza deixaram 62.192 palestinos mortos, a maioria civis, segundo números do Ministério da Saúde de Gaza, que a ONU considera confiáveis.
O.Karatzas--AN-GR